A derrota da seleção brasileira de futebol para a seleção uruguaia na final da copa do mundo de 1950, em pleno Maracanã, foi o que motivou o dramaturgo e escritor Nelson Rodrigues a criar a expressão "complexo de vira-lata". Ele usou essa metáfora para descrever o sentimento de inferioridade que alguns brasileiros têm em relação ao seu próprio país, como se vissem o Brasil da mesma forma que muitos veem um vira-lata: como algo sem valor, inferior ou sem pedigree. Assim, o nome ressalta essa percepção negativa e a falta de autoestima associada à própria identidade nacional.
Para Rodrigues, o fenômeno não se limitava somente ao campo futebolístico:
Por "complexo de vira-lata" entendo eu a inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, em face do resto do mundo. O brasileiro é um narciso às avessas, que cospe na própria imagem. Eis a verdade: não encontramos pretextos pessoais ou históricos para a autoestima.
Esse assunto veio à tona enquanto debatíamos no grupo do WhatsApp do Instituto Zero Morte, quanto à falta de segurança dos veículos fabricados e comercializados no país. Tema que já tratei inclusive em outro artigo. É curioso pensar que os veículos mais vendidos no país, há alguns anos seguidos, são veículos com péssimas avaliações no que se refere à segurança. Ainda Assim, somos um dos países com valores de veículos mais altos do mundo.
Essa constatação me fez recordar de uma entrevista para a qual fui convidado recentemente no Podcast em Trânsito, do grande amigo Professor Carlão. Na ocasião, o seu sócio, Paulo Botelho, que também apresenta o Podcast Papo de Motociclista, contou que em determinada ocasião encontrou um representante nacional da Harley Davidson. Durante a conversa, ele questionou o representante sobre a razão do preço das motocicletas da marca ser maior no Brasil em comparação a outros países. Esperando alguma resposta que envolvesse carga tributária do país ou algo do tipo, ele disse ter ficado perplexo quando a resposta recebida foi apenas um "porque vocês pagam!"
Ainda assim, o Brasil não é o país onde os carros custam mais caro. Estamos atrás de Uruguai, Colômbia, Argentina e Turquia, onde os carros representam 652,29% do rendimento anual médio de um trabalhador, contra os nossos míseros 441,89%.
A pesar disso, caminhamos a passos largos... ou melhor dizendo, avançamos em alta velocidade para superarmos uma marca digna de muito orgulho: O Brasil está entre os países com trânsito mais violento do mundo, sendo o terceiro país com mais mortes em acidentes de trânsito, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS). O país está atrás apenas da Índia e da China.
Me despeço do amigo leitor, após um texto repleto de pessimismo, crítica, ironia e uma pitada de complexo de vira-lata, algumas das maiores marcas da obra do grande Nelson Rodrigues, com outra reflexão desse fantástico artista:
O brasileiro não está preparado para ser o maior do mundo em coisa nenhuma. Ser o maior do mundo em qualquer coisa, mesmo em cuspe à distância, implica uma grave, pesada e sufocante responsabilidade.
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