Recentemente, fui agraciado por estar entre os selecionados para a terceira turma do Curso Digital Visão Zero pela Suécia, oferecido pela Secretaria Nacional de Trânsito (SENATRAN). Dentre os diversos conceitos trazidos durante o curso, gostaria de destacar aqui um que me pareceu de suma importância: a questão do compartilhamento das responsabilidades. Isto é, diferentemente do que se costumava utilizar até pouco tempo, um trânsito seguro não depende somente dos condutores e dos órgãos gestores, mas de uma gama imensa de atores, como as montadoras de veículos, por exemplo.
Pensando nisso, lembrei de uma ocasião em que um amigo me contava de sua experiência em dirigir na França durante suas ultimas férias. Ao chegar na locadora de veículos local e solicitar um Renault Clio, carro que, segundo ele, àquela época, era o veículo mais acessível no catálogo da loja, ficara surpreso ao ser apresentado a um carro que, pela quantidade de itens de segurança e acessórios tecnológicos, mais parecia um Mégane que um Clio. Não é novidade para ninguém que, historicamente, as montadoras no Brasil não seguem um padrão de segurança veicular lá muito confiável. Assim como o fato de o próprio consumidor não se preocupar muito com esses padrões. Não saberia dizer qual dos fatores é causa e qual é consequência. O que me remete ao fato de que, até bem pouco tempo, o carro mais vendido no país durante alguns anos era um modelo que havia sido avaliado com zero estrelas nos crash tests da Latin NCAP.
Enquanto assistia o palestrante falar sobre as responsabilidades das montadoras em projetar e construir veículos mais seguros, lembrei de uma outra responsabilidade tão (ou talvez até mais) premente: o meio ambiente. Quase instantaneamente, pensei em uma iniciativa que acabou virando uma espécie de commodity no mercado financeiro: o crédito de carbono.
O crédito de carbono é um conceito que surgiu em 1997, dentro do Protocolo de Kyoto. O objetivo principal dessa metodologia é reduzir a emissão dos gases do efeito estufa no planeta para combater as mudanças climáticas. Em resumo, um crédito de carbono é gerado a cada tonelada de carbono que deixa de ser emitida. Muitos estudiosos e ambientalistas, no entanto, acreditam que os créditos de carbono não podem ser vistos como algo vantajoso, pois consideram-nos uma licença para continuar poluindo.
Ao pensar sobre isso, uma questão surgiu reluzente como o sol em minha mente: por que não existe ainda uma espécie de créditos de sinistro, que possam ser trocados pelas montadoras cada vez que um ocupante de um de seus modelos é salvo por algum item de segurança de seus veículos? E, da mesma forma, cada vez que um ocupante é vitimado em um sinistro envolvendo um modelo mal avaliado sob o ponto de vista de padrões de segurança, por que essas montadoras não são penalizadas, como forma de mitigar os danos causados pela sua falta de preocupação com esses padrões?
Espero ansiosamente que o Protocolo de Kyoto alcance seus objetivos. Mas espero ainda mais que outros protocolos sejam criados também no trânsito para que, quando esses objetivos forem alcançados, ainda tenham sobrado algumas pessoas suficientemente incólumes para desfrutar desse tão esperado meio ambiente. Ou será realmente o meio ambiente a única preocupação das montadoras?
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